Bate-Bola | Jeozadaque Garcia/Da redação | 12/04/2010 11h43

Bate-bola: Bruno Arce

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”O Estado continua revelando bons atletas, mas não tem uma sequência, um trabalho de alto-rendimento”. ”O Estado continua revelando bons atletas, mas não tem uma sequência, um trabalho de alto-rendimento”. (Foto: Foto: Acervo Pessoal)

Bruno Arce

Ele é um dos representantes da 'nova safra' de jornalistas esportivos em Mato Grosso do Sul, aqueles que têm diploma e não entendem apenas de futebol. Com três anos de profissão, Bruno Arce Vaitti, 23, já teve passagens por Midiamax e TV Guanandi, e hoje é reporter do jornal O Estado.

No Bate-bola, ele conta um pouco sobre como surgiu seu interesse pelo jornalismo esportivo e critica abertamente as autoridades ligadas ao esporte. Segundo ele, "está faltando trabalho sério e de credibilidade"

Esporte Ágil - Quando e como surgiu seu interesse pelos esportes?
Bruno Arce - O interesse pela profissão surgiu devido à influência do meu pai e do meu avô. Desde dos 10 anos, por causa deles comecei a ler jornais. Meu avô era um dos assinantes antigos do Correio do Estado. Gostava muito de ler as páginas de esportes, mais para saber sobre o meu time, o Corinthians. E o caderno B, por causa da televisão e da coluna de José Simão, que antigamente era publicada. Nesta época também ia muito ao estádio com meu avô, operariano doente, influenciou mais ainda a gostar de esportes. Cheguei a ver a decisão entre Operário e Comercial, em 1996. O estádio estava cheio, uma grande partida. Acompanhei jogos da Copa do Brasil, o Galo levou goleada de 6 a 0 do Atlético Mineiro, em 2001, depois de ter terminado o 1º tempo, em 0 a 0. Com os 15 anos, percebi que era profissão que mais me identificava.

EA - Por que decidiu seguir o jornalismo esportivo?
BA - Sobre área esportiva, o elo que me levou foi o futebol, sempre fui mais ligado, como a maioria dos brasileiros. Depois descobri que é uma área mais apaixonante da profissão. O repórter tem um contato maior com os entrevistados, em comparação a outras editorias. Quem escreve nesse segmento acaba virando uma espécie de um "torcedor ilustre". É tão legal quando você faz uma matéria sobre um atleta se preparando para uma competição nacional, contando sobre as suas dificuldades e mais para frente, ele consegue um título importante. A gente acaba comemorando, junto com ele.

EA - Como avalia o esporte hoje em MS? O que pode ser melhorado?
BA - Hoje o esporte de Mato Grosso do Sul está estacionado no tempo, vive só de lembranças. Está faltando trabalho sério e de credibilidade que possa reestruturar. Falta no Estado profissionalismo, gente capacitada e com experiência para criar projetos e executar. O problema começa desde da legislação. Não existe projeto de leis de incentivo ao esporte ligado as empresas. Aqueles poucos que tem são insuficientes, como FAE e FIE, que é uma mixaria em relação ao repasse que a Prefeitura e o Governo arrecada a cada ano, e para piorar atende a minoria e grupinhos.
As empresas não investem por falta de credibilidade, porque aqui no Estado, os dirigentes trabalham para atender suas necessidades, ninguém tem coragem de tirar o dinheiro do bolso.
Quando surgem trabalhos sérios como do professor Hugo Costa, de Ponta Porã, da equipe do Porabask, que atendia mais 30 crianças carentes, dando aula de basquete em quadra de terra, ninguém do Estado foi lá e apoiou. Foi preciso vir uma pessoa de fora, como ex-jogador Oscar Schmidt para ajudar. Mato Grosso do Sul precisa urgente de uma política para o esporte.
Outros problemas que o Estado também não tem praça esportiva. O Morenão continua com seus defeitos. O Guanandizão necessita urgente de uma reforma, vai ser preciso acontecer um problema sério para reformá-lo. Hoje o que se salva por enquanto é o Autódromo, mas graças a última reforma. Isso só aconteceu depois de ficar de fora rota nacional de competição.

EA - O que acha das contínuas reeleições nas presidências das entidades e federações? Isso prejudica ou melhora o trabalho?
BA - As reeleições provam com o tempo que não é solução para o esporte e até para cargos políticos. Eu penso que tinha que ser proibido, porque hoje o cargo de presidente de federações parece uma monarquia, que assume não larga, ficam mais de uma década no poder. Deve ser muito bom trabalhar para o "bem" do esporte. Isso porque é um cargo voluntário que não pode receber salário. Eu acredito que o esporte necessita de renovação, senão o trabalho fica na mesmice.

EA - Desde que começou a atuar na área, o que mudou no cenário esportivo de MS?
BA - Desde que comecei a três anos na profissão, acredito que não mudou nada. E nem vejo se terá uma mudança nos próximos anos. O futebol continua o mesmo, inicia a semana a mesma falta de desorganização, ninguém sabe a onde e o local do jogo. Se isso atrapalha a imprensa para trabalhar, imagina ao torcedor.
O que me surpreendeu na profissão foi saber a força que o Estado tem nas categorias iniciantes, entre as faixas etárias dos 10 a 14 anos. Tem muita gente boa, como Daniel Grimm, na natação, a Evelin Tomi, no tênis de mesa e Emory Alves no judô. O Estado continua revelando bons atletas, mas não tem uma sequência, um trabalho de alto-rendimento. Os destaques ou desistem de seguir carreira profissional por falta de apoio ou vão embora para outro Estado. O ciclo continua, assim que sobrevive o nosso esporte.

EA - Qual fato ou evento esportivo ficou marcado em sua memória desde que começou atuar na área?
BA - O fato mais marcante comigo aconteceu no lance do borderô da Copa do Brasil. O erro de prestação de contas estava escancarado e mesmo com matérias denunciando nada aconteceu. Nem mesmo depois das acusações do dirigente do Corinthians, Andrés Sanches, que chamou todo mundo de ladrão, ninguém fez nada. A farra continuou.
No jogo do Naviraiense e Santos, foi divulgado 9 mil pessoas como público, até quem não foi no estádio viu que tinha mais gente. É triste ver a ganância de determinadas pessoas. O engraçado que Procon e Mistério Público nesta hora não entram em ação. O que me deixa mais chateado quem paga o "pato" são os torcedores, como sempre. São eles que vão ao estádio e pagam R$ 100 para ver a Seleção Brasileira. O ingresso mais caro de todas as Eliminatórias de Copa do Mundo. E mais uma vez ninguém reagiu, pelo medo de represálias. E o pior nem os colegas de imprensa questionaram isso. Parece que acharam normal o valor. Nesta hora falta também uma imprensa mais forte que questiona.

EA - Acredita que a Funesp e a Fundesporte têm atuado de maneira correta na distribuição das verbas?
BA - Eu não sei dizer se é feita a distribuição de maneira correta, porque não sabemos como que chegam os projetos para os dois órgãos públicos. Se existem pedidos exorbitantes para campeonatos que não necessitam de tanta verba. Mas tanto o FAE e o FIE, não apresentam a imprensa e principalmente aos esportivas como são feitos as seleções de escolhas.
É um mistério. O que dar para concluir que as federações de automobilismo, motociclismo, tênis de mesa e biribol devem fazer ótimos projetos. Porque toda vez são eles que mais recebem, por trás disso devem  ter boas assessorias jurídicas.
Só que o estranho que o "bom" trabalho não reflete dentro da modalidade. Tirando o talento da Evelin Tomi, no tênis de mesa, não surgiu nenhum grande nome nos últimos anos nestas modalidades.

EA - Na sua opinião, qual a importância de uma assessoria de imprensa para um clube? Isso hoje faz falta?
BA - As federações e clubes de futebol ainda não enxergaram a importância que tem uma assessoria de imprensa. Como a presença de um jornalista nos eventos esportivos, ajuda bastante na divulgação. Hoje para você colocar um anúncio de um parágrafo no jornal custa quase R$ 100, o espaço. Na editoria de esporte os eventos são divulgados de forma gratuita. E os organizadores nem dão valor.
Aqui no Estado como é difícil pegar resultado da rodada do futebol. Isso porque tem uma empresa que presta serviço de assessoria de imprensa. E quando informam passam os resultados somente no dia seguinte.
Às vezes com a correria do dia-a-dia passam campeonatos despercebidos, por falta de informação e não por falta de espaço. Neste ramo da comunicação dá para perceber a falta de profissionalismo que existe em Mato Grosso do Sul. Por exemplo, quando ligamos para um clube de fora do Estado, o atendimento chega a ser 100 % melhor, eles enviam fotos e o contato do atleta. Facilita muito. Aqui os esportistas viajam e ninguém sabe. Só ligam quando ganham. E no futebol só mandam texto quando vencem. Até parece que a gente não vai saber quando eles perdem.


EA - Para 2010, o Campeonato Estadual de Futebol recebeu cerca de R$ 700 mil. Você acha que ainda falta apoio ao futebol local? Por quê? Para você, quem são os culpados pela situação em que chegou o futebol de MS hoje?
BA - O que falta no futebol é mudança, para depois querer recalcular o repasse do Governo. Eu penso que os clubes por serem privados não precisam receber dinheiro, mas com a atual situação necessitam de ajuda. O futebol primeiro precisa de reciclagem. O primeiro passo é trocar a presidência, Francisco Cezário está muito tempo no cargo, mais de 19 anos. Falta um sangue novo.
Dentro de campo, o futebol precisa ter atrativo, porque não usa os R$ 700 mil como premiação, como é feito em Mato Grosso. Com uma "bolada" dessa, os times iriam se preparar melhor para ganhar o campeonato, contratando bons jogadores e investindo realmente na competição.
Aqui o único prêmio ao campeão é a vaga a Copa do Brasil, para disputar um jogo. Outra não existe nenhuma campanha para trazer os torcedores novamente ao estádio. Porque a FFMS não utiliza esta parceria que diz que tem com o Grupo Gazin, e não sorteiam móveis e televisões para o público.
Outra: os dirigentes têm que parar de colocar os jogos em horários nobres, que concorrem diretamente com as partidas de televisão. Isso é fato, quem hoje vai ao estádio são torcedores antigos que presenciaram a glória do passado ou que são fanáticos por futebol. Os restantes preferem ver os jogos pela televisão que é muito mais agradável.
A própria FFMS não busca divulgar o campeonato, não faz parceria com televisão, para transmitir pelo menos passar os gols em rede aberta. O futebol precisa começar do zero, os clubes precisam voltar a trabalhar a base, primeiro. Voltando a disputar os campeonatos SUB-13, 15, 17, 18 e 20.
O único clube que faz isso aqui no Estado se chama Cene. O Amarelão descobriu a forma de lucrar. O time ganhou muito dinheiro com a venda do Keirrison. Se os restantes dos clubes não adotarem a mesma política, continuarão atrasando salários de jogadores e aumentando ainda mais as suas dívidas. Os times precisam parar de trabalhar de forma amadora.

EA - Para finalizar, que dica você dá a quem deseja seguir carreira como jornalista esportivo?
BA - A profissão do jornalista esportivo é muito bacana, porque permite ter um contato mais próximo dos seus ídolos e entender realmente como funciona o esporte no País. Mas aqueles que querem seguir carreira têm que informar das dificuldades que irão enfrentar. O jornalista não tem feriado, não tem o domingão para ficar com a família e com os amigos. Irá passar por muita "saia justa" com entrevistados mal educados. Mas no final das contas é bastante prazeroso.

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