A fisiculturista Nathália de Carvalho Mahamed, 30 anos, encontrou no esporte muito mais do que um caminho para a estética ou competição. Nascida em Ariquemes (RO) e criada em Campo Grande (MS), ela iniciou sua trajetória no fisiculturismo aos 26 anos, impulsionada por uma tentativa de superar a depressão pós-parto.
“Comecei no fisiculturismo aos 26 anos com intuito de ser uma estratégia para sair de uma depressão pós-parto que durava quase dois anos”, conta. “Sempre fui muito magra, a ponto do físico apresentar muitas marcações dos ossos, e inclusive acreditava que fazer musculação iria me emagrecer mais.”
A relação com o próprio corpo, inicialmente carregada de dúvidas e receios, deu lugar a uma nova identidade. A prática esportiva passou a representar para Nathália uma oportunidade de reconstrução. “A busca estética se transformou em algo muito maior: disciplina, estrutura emocional e identidade”, relata.
Desde o início, a categoria wellness chamou sua atenção. A escolha não foi por acaso: “Ela representa força, feminilidade e potência física, tudo junto”, explica. A atleta chegou a receber uma proposta de treinador internacional para migrar à categoria bikini, mas preferiu manter-se fiel à sua escolha.
O wellness, categoria em ascensão no fisiculturismo feminino, exige “equilíbrio entre volume muscular (principalmente em glúteos e pernas) e feminilidade”, como define Nathália. A exigência técnica também é alta: densidade muscular, baixa gordura corporal, simetria e presença de palco. “A exigência é alta, e a postura precisa ser confiante, empoderada e ao mesmo tempo atraente”, pontua.
A rotina da atleta é marcada por uma preparação intensa, especialmente quando se aproxima das competições. A dieta é seguida com rigor: “Na preparação, sigo dieta 100% focada: pesagem dos alimentos, horários, zero margem de erro. A mente tem que estar 10 vezes mais forte que a fome ou gatilhos mentais”, diz. No período fora da temporada, mantém certa flexibilidade, mas ainda com controle e estratégia.
As conquistas de Nathália no esporte vão além dos troféus. “Foi subir no palco sabendo que enfrentei meus próprios bloqueios mentais e traumas com o corpo”, define. Ainda assim, dois momentos se destacam: o título de Overall conquistado em Campo Grande, sua cidade, apenas três meses após a perda da filha no parto; e o terceiro lugar em um campeonato de nível nacional no ano passado.
Ela destaca que, apesar da evolução do esporte no Brasil, ser atleta de alto rendimento em Mato Grosso do Sul ainda impõe desafios estruturais. “Faltam recursos, visibilidade e reconhecimento local. O investimento emocional e financeiro é grande, então é necessário trabalhar muito para custear o esporte”, explica. Com uma realidade que envolve ser mãe solo e única provedora da casa, Nathália ainda lida com os altos custos do esporte, como a filiação a uma federação que cobra em dólar.
A pressão estética, inerente ao fisiculturismo, também é tema recorrente. “Quase sempre lido muito bem — e acho importante falar disso. A cobrança interna pode ser muito maior do que a externa”, analisa. Para manter o equilíbrio, ela aposta no autoconhecimento e na rotina de trabalho como mentora de atletas, o que também contribui para sua autorregulação emocional.
A visibilidade das mulheres no esporte tem aumentado, segundo a atleta, mas ainda esbarra em preconceitos sociais. “A mulher forte assusta, incomoda, quebra padrões. Por isso, cada mulher que sobe no palco é uma revolução pessoal e coletiva”, afirma. Ela também chama atenção para um contraste: os custos para competir são maiores para mulheres, enquanto os salários e apoios financeiros nem sempre acompanham essa equação.
Atualmente, Nathália conta com o apoio de uma casa de suplementos, de uma marca de cinta modeladora e do próprio coach, que também patrocina parte de sua jornada. “O suporte emocional é tão importante quanto o financeiro. Ter uma equipe alinhada, um coach presente e humanizado para lidar com o psicológico, amigos que entendem o processo — isso faz diferença”, destaca.
A trajetória pessoal e esportiva de Nathália se tornou uma fonte de inspiração para outras mulheres. Sua mensagem para quem deseja começar é clara e direta: “Vá com medo mesmo. O palco é só a ponta do iceberg — o mais valioso é o que você vai se tornar durante o processo”, aconselha. E complementa: “Não espere estar ‘pronta’, porque a transformação começa no primeiro passo. Algumas melhorias só acontecem com a quantidade de vezes em que se passa por um processo de finalização.”
Mais do que o físico moldado por treinos e dietas rígidas, Nathália representa uma jornada de superação, enfrentamento e reconstrução. Sua história mostra que o fisiculturismo pode ser, também, uma ferramenta de cura. “Nunca deixe que os outros definam o que é bonito, forte ou certo pra você”, finaliza.