“Ali eu via tudo indo por água abaixo.” A frase, dita com franqueza por Everton Rocha da Silva, de 28 anos, resume um dos momentos mais difíceis da trajetória do jogador de Maracaju (MS), que se dividiu entre o futsal e o futebol de campo ao longo da vida. Com uma história marcada por persistência, superações pessoais e obstáculos físicos, o atleta encontrou no esporte um propósito — e no recomeço, uma missão.
Nascido em 28 de fevereiro de 1997, Everton começou cedo no esporte. “Comecei a jogar futsal muito cedo, desde garoto, desde os 8 anos de idade. Iniciei jogando jogos escolares municipais naquela época”, recorda. Foi nesse período que ele descobriu não apenas o prazer da competição, mas também sua maior motivação: a avó. “O que mais me motivou a seguir esse esporte, tanto futsal quanto o campo, foi minha vó, que hoje já não está entre nós, mas segue sendo minha inspiração em tudo que faço.”
A infância foi vivida com as limitações comuns a muitos jovens atletas brasileiros: “Principal dificuldade foi a questão financeira. Vim de uma família muito humilde na verdade. Acho que é o que mais pesa hoje em dia para seguir em busca desse sonho”, relata. Mas mesmo diante das barreiras econômicas, ele seguiu. E conquistou. Entre os principais momentos, destaca o vice-campeonato estadual de futsal nas categorias de base, no ginásio do Colégio ABC, em 2013, e o vice-campeonato da Série B estadual de futebol pela equipe do MAC, de Maracaju.
Em 2020, após se profissionalizar no futebol de campo, Everton chegou a disputar o Campeonato Sul-Mato-Grossense e estava com a transferência encaminhada para o Nova Mutum, do Mato Grosso. “Estava tudo certo para partir, porém, em seguida veio a COVID-19 e o sonho foi rompido.” Antes disso, ele já havia tentado a sorte em testes em outros estados. “Quando mais novo tive algumas oportunidades em São Paulo e Minas Gerais. Passei por testes, mas infelizmente nenhum deu certo na época, isso em 2012 por aí.”
Mas nenhuma dessas decepções se comparou ao que viria em 2023, quando uma cirurgia de hérnia inguinal bilateral o afastou completamente dos treinos e competições. “Passei por uma cirurgia muito difícil. Fiquei oito meses afastado das quadras e do campo. Quando estava quase voltando, aconteceu algo que com certeza mexeu muito psicologicamente.” Sem entrar em detalhes sobre o episódio, ele reconhece que cometeu um erro: “Assim como qualquer ser humano erra, eu fui mais um deles. Ali eu via tudo indo por água abaixo.”
A recuperação foi longa, não apenas do ponto de vista físico. “Fisicamente eu sempre estive bem e também achava que psicologicamente eu também estava. Nos treinos físicos eu sempre me destacava. Porém, eu não saberia que seria difícil essa volta depois de um ano e meio longe das quadras e gramados. Foi difícil. Eu tava no fim do poço.” Mesmo assim, Everton reagiu. “Graças a Deus eu saí de lá porque fui persistente. Tinha mil motivos pra desistir, mas não. Eu segui batalhando, treinando e correndo, me preparando como posso.”
A luta silenciosa, enquanto enfrentava julgamentos e dúvidas, fortaleceu o espírito de quem hoje se considera mais maduro. “Enquanto muitos estavam me julgando, eu tava me preparando. E é isso que devemos fazer: não ligar para as críticas e julgamentos das pessoas, pois o único que pode nos julgar morreu na cruz por nós.”
Atualmente, ainda em fase de recuperação e não 100% fisicamente, ele segue treinando da forma que consegue, conciliando os compromissos do esporte com o trabalho. “Hoje estou de volta. Ainda não estou 100%, mas logo estarei. Estou treinando como posso, me preparando como posso.”
Mesmo sem grandes passagens em clubes de maior expressão, Everton diz que o reconhecimento chegou de outras formas. “No futsal, não tive grandes oportunidades, mas já no campo me profissionalizei. Hoje sou grato a Deus pela minha família, pelos meus filhos e também pela minha esposa Fernanda, que me ajudou a sair da pior.”
E para quem o acompanha, o exemplo já inspira. “Recebo mensagens diretas de alguns amigos conhecidos falando que sou exemplo de superação. De quem tava no fundo do poço e saiu. Hoje sou grato a Deus por tudo que tem feito em minha vida.” A ajuda da família também foi fundamental. “Minha irmã Franciele foi peça fundamental para me ajudar a sair daquele poço. Minha mãe também, meu pai, no seu momento difícil...”
Sobre o cenário do futsal em sua cidade natal, Everton vê avanços. “Acho que está tendo o maior suporte, principalmente agora com uma arena moderna. As equipes aqui sempre tiveram respaldo da prefeitura, acredito eu.” Ainda assim, vê que é preciso persistir para se destacar. “No esporte não é tão fácil assim estar sempre sendo artilheiro, estando entre eles. Eu coloco na minha cabeça que é foco e persistência.”
Aos jovens que sonham em seguir o mesmo caminho, ele oferece um conselho direto, vindo da experiência: “Não desistam. Sejam focados e persistentes. Com certeza vai haver muitas barreiras e dificuldades no caminho, mas a chave do sucesso é o foco e o comprometimento, principalmente com os treinos. Isso destaca um atleta e faz ele se tornar um grande profissional.”