Pan-americano | UOL | 01/06/2007 10h54

Megalomania e o improviso atrapalham o caminho da tocha

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Rio de Janeiro (RJ) - Muito mais do que o ideal de união entre os povos, que deu origem ao símbolo, a tocha pan-americana dos Jogos Rio 2007 virou num primeiro momento um modelo de megalomania (como os próprios estádios e ginásios do evento). No final, tornou-se uma representação do improviso.

A idéia inicial do Co-Rio, o comitê organizador do evento, era fazer com que a tocha passasse por todas as cidades que tivessem sido sede do Pan, todos os 42 países participantes do evento, além de todas as capitais brasileiras e algumas outras cidades do Rio de Janeiro.

O ambicioso projeto foi vetado pela Odepa (Organização Desportiva Pan-Americana). O diretor da entidade justificou sua posição dizendo que a longa viagem aumentaria demais os custos da organização do evento. Preocupação que parece inexistente para a organização brasileira, uma vez que o orçamento do evento já aumentou em mais de 400%.

Limitado ao território brasileiro, o trajeto de revezamento da tocha envolve 51 localidades, incluindo todas as capitais estaduais. O projeto, de R$ 10 milhões, está sendo bancado pelo governo federal e por um patrocinador privado. Mesmo assim, os custos locais, no valor de R$ 1,6 milhão, foram repassados para as cidades anfitriãs por meio de uma taxa de adesão, que podia chegar até R$ 56 mil.

Houve reclamações, e alguns municípios, como São Bernardo do Campo (SP), abriram mão de receber o fogo pan-americano. "Declinamos por causa do alto custo. Achamos melhor alocar os recursos da forma mais conveniente", explica o secretário de Esportes local, José Piovesana.

A cidade fluminense de Cabo Frio, que também havia sido convidada pelo Co-Rio, ficou de fora. "Nós tivemos problema com o pagamento de precatórios, o que afetou nosso caixa", explica o subsecretário de esportes, Fernando Henrique Lima.

Ele acrescenta outro problema para receber o evento. "O convite foi feito muito em cima da hora. Se tivesse chegado em meados de fevereiro, por exemplo, nós teríamos interesse. Mas todo o processo depende de licitações, e isso é demorado."

Apesar de ter sido divulgado apenas na última terça, os preparativos para o revezamento começaram bem antes. Em junho de 2004, quando o Rio foi um dos pontos de passagem da tocha olímpica rumo a Atenas, o presidente do Co-Rio, Carlos Arthur Nuzman, anunciou a realização do evento.

Naquele momento, empolgado pela visibilidade do revezamento, que reuniu 1,4 milhão de pessoas pelas ruas da capital fluminense, o dirigente já falou em passagem da tocha "pelas Américas". Com a nova dimensão do projeto, o discurso mudou. E Nuzman declarou que "o revezamento é mais uma oportunidade de levar o Rio 2007 a todas as partes do Brasil."

Quem resolveu bancar os gastos, tentou minimizar o rombo no caixa. Em Porto Alegre, o poder municipal reclamou, o governo estadual entrou na organização, e a estimativa inicial de custos, que batia na casa dos R$ 100 mil, resultou em R$ 7 mil. "Fizemos parcerias com a iniciativa privada para oferecer a estrutura necessária. Este é o evento do ano no Brasil e, por isso, não dá para ficar de fora", afirma o diretor da secretaria estadual de esportes, Henrique Valério.

O município de Macaé (uma das mecas nacionais do petróleo), que não estava na primeira lista de convidados oficiais, divulgada em 19 de abril, acabou entrando no trajeto. "O prefeito entrou em contato com o COB (Comitê Olímpico Brasileiro)", explica o subsecretário municipal de esportes Valter Bittencourt. "Nosso município já tem uma grande ligação com o esporte, com um time de vôlei forte, recebemos também a eliminatória da Copa do Mundo de beach soccer e o torneio de showbol. Não poderia faltar no evento da tocha", completa.

Na histórico Parati (RJ), a idéia é que a festa de agora se transforme em mais verba para o município no futuro. "Estamos gastando R$ 23 mil para receber a tocha, além dos custos com a parte cenográfica das recepções que serão organizadas. E já temos agendada uma audiência com o ministro do Esporte para negociar a liberação de mais recursos para Parati", afirma a secretária de esportes Heloísa Bertino.

Segundo ela, será uma oportunidade para que o município, que tenta obter o título de patrimônio mundial, ganhe mais projeção. Uma das celebridades que devem participar da cerimônia é o velejador Amyr Klink.

Em Mato Grosso, a passagem da tocha faz parte de um grande projeto ligado ao esporte, que inclui o ginásio Aecim Tocantins, sede das partidas da Liga Mundial de vôlei entre Brasil e Finlândia, os planos para ser uma das subsedes da Copa do Mundo-2014, e dos Jogos Interculturais Indígenas, que começam no mesmo dia da passagem da tocha pela aldeia de Campo Novo de Parecis, que fica a 350 km da capital Cuiabá.

"O Pan é uma euforia no país todo e nos dará um retorno grande", acredita o secretário adjunto de Esportes do Estado, Laércio Arruda. "Serão gastos R$ 70 mil na montagem da estrutura para a passagem da tocha nas duas localidades, mas se ganha muito em divulgação", acrescenta.

A localidade de Campo Novo de Parecis está na lista de localidades que ficaram isentas do pagamento da taxa de adesão exigida pelo Co-Rio. Segundo a assessoria de imprensa do comitê, por não ser município e não ter recursos, a localidade não poderia pagar a taxa, assim como o quilombo de Campinho da Independência, no Rio de Janeiro. "São comunidades de interesse cultural", diz o comunicado.

Também ficaram isentas as cidades que serão o ponto de partida do revezamento, Santa Cruz Cabrália e Porto Seguro. Os gastos nestes dois locais fazem parte do orçamento global previsto no projeto. Canindé de São Francisco, no Sergipe, por ser um "local de breve passagem no roteiro", e Fernando de Noronha, por "não ser um município, mas uma ilha de interesse turístico", também ficaram livres da cobrança.

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