Basquete | Rosália Silva | 25/07/2004 21h45

Janjão esteve em CG depois de conquistar título inédito

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Janjão esteve em CG depois de conquistar título inédito

O campo-grandense Joelcio Joerke, o Janjão, 31 anos, de férias em sua cidade natal recebeu o Esporte Ágil para uma entrevista. Ele acaba de ajudar a conquistar um título inédito no Campeonato Brasileiro de Basquete para um time mineiro. Janjão nesta temporada defendeu a equipe Unit/Uberlândia, que venceu o Flamengo/Petrobras por 81 a 66 no terceiro jogo do playoff final, fechando a série em três a zero. Neste domingo, dia 25, o jogador voltou para Minas Gerais, onde está em negociação para renovar o contrato. Janjão defendeu diversos clubes no Brasil e por uma temporada esteve na Itália. Mas conta que sua maior realização foi ter defendido o Brasil na Olimpíada de Atlanta em 1996, quando ficou em sexto lugar. Já que a Seleção Brasileira masculina, pela segunda vez, não se classificou para os Jogos Olímpicos, Janjão torce por uma final entre Brasil e Estados Unidos no naipe feminino.

Esporte Ágil Como você começou a jogar basquete?
Janjão A minha vida inteira eu estudei na Mace aqui em Campo Grande e aos 13 anos o professor de Educação Física da época, até pela minha altura e pouca idade, me chamou para treinar com ele. Eu comecei, gostei bastante e passei a disputar o campeonato estudantil. Participei da seleção do Estado, joguei alguns campeonatos brasileiros e recebi um convite de São Paulo, na época era o Sírio, para treinar lá. Isso aconteceu uns três anos depois de começar a treinar na Mace. Mas como eu tinha alguns amigos que estudavam em Franca, resolvi ir para lá. Meus pais me levaram para Franca para fazer o teste, chamado de "peneirão": numa semana vão garotos do Brasil inteiro para fazer testes, eles ficam lá treinando com o time principal. Fiquei lá uma semana, treinei, eles gostaram de mim, e acabei ficando na infanto-juvenil. Logo passei a ser aproveitado no juvenil, mais tarde no principal. Franca na época tinha uma equipe muito boa, de muita projeção, e como era uma equipe de competição o time investia muito em jovens. O técnico era o Hélio Rubens, e começou a me aproveitar na equipe principal. Nós demos sorte porque a equipe começou a ganhar os campeonatos Brasileiro e Sul-Americano. Com isso me projetei, fique seis anos em Franca e depois passei em várias equipes: São Paulo, Rio de Janeiro, um ano na Itália, Goiânia, e agora Uberlândia.

Esporte Ágil Como você foi chamado para a Seleção Brasileira?
Janjão Quando a gente está aqui em Campo Grande, tem uma imagem que parece impossível de jogar na seleção. Depois que a gente está lá no dia a dia, vê que tudo depende do trabalho. Se tudo dá certo, vamos sendo campeões. E como era muito jovem, então tinha muito futuro e isso foi ajudando bastante. Estar no lugar certo, com as pessoas certas também: o Hélio Rubens era o técnico da seleção. Joguei dois mundiais defendendo o Brasil e uma Olimpíada, com técnicos diferentes.

Esporte Ágil Alguém da sua família é esportista, está seguindo o seu exemplo?
Janjão Eu sou o primeiro esportista na família, profissional, até mesmo pela minha altura. Meus irmãos são advogados e agora a minha irmã mais nova, talvez se espelhando em mim, está fazendo Educação Física. Na família fui o único que foi por esse caminho, que muita gente não vê como profissão, uma coisa muito difícil, eu também via assim. Mas chega uma hora na vida que a gente tem que tomar uma decisão, e resolvi optar pelo esporte e estou muito feliz.

Esporte Ágil E qual é a sua rotina de treino?
Janjão Varia muito no decorrer do campeonato. Na pré-temporada a gente treina muito mais. Basicamente treina duas horas de manhã, das 10 às 12 horas e depois à tarde. Isso vai muito em função do jogo, na véspera a gente diminui um pouco a carga de treino. Quando a competição está mais longe, a gente dá mais ênfase a parte física, que é o treino mais chato. Varia muito: da época do campeonato, da proximidade dos jogos. Depois que a gente começa a temporada, no começo de agosto e vai até o final de junho, julho.

Esporte Ágil Seus pais moram aqui e você e sua família estão lá...
Janjão É, em Franca conheci minha esposa, temos dois filhos e minha família toda continua aqui. Esse é um dos fatores que leva muita gente a desistir de continuar no esporte, porque tem que estar longe de casa. Na época tinha 16 anos, mas acabou sendo uma escola de vida para mim. No fundo os maiores obstáculos para você se tornar um atleta de sucesso, às vezes estão fora da quadra. Tem que superar a distância, a saudade da família, esses tipos de coisas, e muita gente fica no caminho por causa disso.

Esporte Ágil E sua mãe e seu pai, como eles reagiram quando você disse que estava indo para São Paulo?
Janjão Eles me apoiaram, apesar de que hoje eu tenho filho eu sei que deve ter sido uma decisão horrível, difícil. Mas eles foram fundamentais e disseram que se era isso que eu queria, então tinha que tentar mesmo para depois não ficar frustrado. Foi fundamental, porque muita gente não tem esse apoio em casa. Vêem o esporte não como profissão, mas como divertimento. Esse é um lado que contou muito a meu favor, me levaram até lá, deram todo apoio. Principalmente, no começo, para um garoto de 16 anos sair de casa, depois passa uns dois meses e tudo o que tinha em casa não tem mais e tem que batalhar para conseguir, isso é muito difícil. Quem não tem objetivo definido, vê esses obstáculos como algo intransponível. Barra na saudade da namorada, dos pais e acaba não dando certo.

Esporte Ágil Você tem acompanhado o basquete aqui da cidade, do Estado?
Janjão Tenho uns amigos, como o professor Ronaldo, o professor David, Luis, que sempre que venho para cá entro em contato. Eu sei que aqui falta muito patrocínio. É difícil ter uma escola, tem que ter um modelo, um espelho perto deles para eles possam seguir. É muito difícil você treinar um esporte sem ter alguém para se espelhar, perto de você, a convivência. Vê na televisão, mas aqui não tem ninguém que te incentiva, um exemplo perto para se espelhar. Por isso é muito difícil, tudo depende de patrocínio. Falta alguma coisa mais forte. Algum tempo atrás foi o time feminino que todo mundo comentou, no Brasil todo, mas o projeto simplesmente acabou. Então, essa continuidade é necessária. A partir do momento que o governo, a Prefeitura, as escolas entenderem que o esporte é uma formação para jovens, não é só formar um atleta. Só o fato de estar vivendo em um ambiente esportivo, o atleta praticando esporte, você desenvolve algumas virtudes que passa para todo mundo: a disciplina, respeito ao adversário, saber conviver com a vitória e a derrota, sucesso e fracasso. Quando a gente tiver essa consciência, as coisas no esporte vão ser mais fáceis.

Esporte Ágil E quais são os seus projetos a partir de agora?
Janjão Nós fomos campeões brasileiros em Uberlândia, então estou nessa fase de renovar contrato. Saber se renovo com Uberlândia e nestas férias é justamente para isso. Mas meu projeto é continuar, a gente conseguiu um título inédito para Minas Gerais, que foi algo espetacular e eu espero continuar. É muito difícil formar um centro de excelência no esporte, como está sendo formado o basquete lá em Uberlândia. A garotada toda praticando, a gente está conseguindo muita coisa legal, não só dentro da quadra, mas fora. Escolinha de crianças carentes por exemplo. Então, espero ter um projeto mais a médio prazo, continuar lá para desenvolver cada vez mais o esporte não só em São Paulo que já está desenvolvido.

Esporte Ágil Você poderia contar um pouco dos principais títulos que conquistou, um pouco da história de cada um, o mais difícil?
Janjão Saí daqui e fui para Franca onde consegui dois campeonatos brasileiros e dois paulistas. Depois, fui jogar em São Paulo e ganhei um paulista em Mogi das Cruzes. No Rio de Janeiro, joguei três anos, ganhei dois campeonatos cariocas, dois pelo Vasco e joguei um ano no Flamengo. Fomos campeões brasileiros no Vasco e campeão da Liga Sul-Americana, onde que foi a primeira equipe brasileira campeã deste torneio. Fui para a Itália, joguei um ano, fomos campeões da Taça Itália, e foi muito legal pela experiência não só de jogador, mas experiência de vida de viver num País fora. Voltei para o Brasil, fui para Goiânia um ano e agora em Uberlândia em que fomos campeões brasileiros e vice no Sul-Americano. Fora isso, na Seleção, o campeonato mais importante que guardo com muito carinho, apesar de não ter ganho medalha, foi a Olimpíada de Atlanta, que foi uma experiência de vida e uma recompensa. Nisso sou muito feliz por ter conseguido, porque é muito difícil realmente. Agora já são duas Olimpíadas que o Brasil não consegue se classificar. E na época foi muito legal porque foi a última Olimpíada do Oscar. Foi algo que me marcou bastante. Apesar de não ter ganhado, a experiência foi muito positiva.

Esporte Ágil E na sua opinião porque o basquete masculino não está conseguindo ir para as Olimpíadas?
Janjão O basquete está passando por uma renovação muito grande. Eu acho que até faltou um pouco de critério para ser feito, porque você tem que mesclar um pouco, colocar um pessoal mais velho junto a garotada, porque na hora da decisão é difícil mesmo. O Brasil pecou um pouco por isso, por ter renovado drasticamente, e não conseguiu o resultado para se classificar para Atenas. Você acaba sacrificando uma geração, porque Olimpíada é o foco de atenção do mundo inteiro e o esporte que fica fora dos jogos fica um pouco de lado. Mas agora que já temos quatro jogadores na NBA, o interesse está crescendo muito entre o pessoal mais jovem que acompanha bem mais a NBA do que o campeonato brasileiro. Eu vejo com muita esperança o futuro do Brasil no basquete. A geração que está chegando aí está vindo com muito talento, muito potencial. Acho que ao conquistar um pouco de experiência, daqui a quatro anos, vamos ter muitas alegrias com a seleção.

Esporte Ágil E como você espera que seja apresentação da Seleção Brasileira feminina de basquete?
Janjão As meninas são as nossas representantes e acho que as grandes adversárias são as americanas porque elas têm uma liga muito organizada. Até por uma tradição do País, em que o primeiro esporte é o basquete. Mas a gente espera que as brasileiras disputem a final com os Estados Unidos. É a nossa esperança.

Esporte Ágil Você tem algum sonho que deseja realizar no basquete?
Janjão Sonho não. É continuar jogando em equipes competitivas o maior tempo que eu puder, ganhando títulos. Eu prefiro falar em objetivo, que algo mais real. Então é isso, continuar fazendo o que eu gosto, o maior tempo possível. Ganhando sempre, não só ganhar pela vitória, mas pela experiência de jogar em campeonatos mais competitivos.

Esporte Ágil Você tem alguma dica para passar para os jogadores, aqueles que estão querendo começar a jogar em competições. Nesta semana, dois atletas de Maracaju estão indo estudar e jogar basquete nos Estados Unidos. O que é preciso para alcançar objetivos?
Janjão A gente acha que um campeão, um jogador que se destaca, tem coisas que a gente não tem aqui para treinar. Mas é tudo mentira. O que eu vejo em São Paulo, no Rio de Janeiro, eles tiveram exatamente o que tive aqui: uma quadra, uma bola e um professor para te dar treino. Então, se você acreditar no potencial, que você pode chegar lá, se realmente quiser. É claro que no caminho vão ter vários acontecimentos que vão te desanimar. Mas o que precisa é o que a gente tem aqui, a partir daí a gente vai melhorando cada vez mais. Não é ficar pensando que se não tiver uma quadra bonita, uma bola mais moderna, não vai conseguir. É praticar na escola, estudando, o que é muito importante, e ter o objetivo de ser campeão. No esporte é exatamente isso, treinar todo dia, que você vai ser chamado, vai ser reconhecido.

Esporte Ágil Aqui em Campo Grande você também tem um encontro marcado com alunos da Funlec, o que você vai estar passando para eles?
Janjão Eu também morava aqui, estudava aqui, quando via um ídolo na TV achava que ele era diferente. Na verdade, eles são o que eu já fui um dia. Não tem essa imagem de ídolo, de intocável. Dizer que eu fazia exatamente o que eles fazem agora, treinava do mesmo jeito que eles treinam. Tem que valorizar quem é daqui também. Não tem nenhuma coisa irreal, de São Paulo, do Rio, nada disso, tem que ter pé no chão. Todo mundo sabe que o trabalho daqui é bem feito na medida do possível. E todo mundo tem condições de chegar a ter um destaque esportivo no basquete.

Esporte Ágil Seus filhos acompanham você, assistem aos jogos?
Janjão Acompanham. Eles vivem num ambiente esportivo. Eles vão acabar, não sendo jogadores, mas convivendo nesse ambiente, praticando esporte. Eu sou suspeito para falar porque vivo do esporte, mas tendo um filho ou uma pessoa querida praticando esporte elimina uma série de dificuldades que outros pais não têm. Você tira a criança da rua, passa a respeitar mais a outra pessoa, ter objetivos. Eu gostaria que todas as crianças praticassem esporte, mas sei que falta muita estrutura para isso também.

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